Em primeiro lugar, é mister dizer que estou com dor. No ombro. De novo.
Portanto estou mais cínica e com menos paciência do que o normal.
Fui com uma amiga assistir “Meia Noite em Paris”, do Woody Allen. Na entrada, um velhinho parecia confuso e ofereci ajuda para localizar o assento dele. Ele recusou a ajuda e disse que ia sentar do meu lado, já que o cinema estava vazio.
Na saída, ainda embevecidas pelo filme, fomos convidadas pelo senhorzinho para tomar um café no bistrô do cinema, e aceitamos. Ele, muito galante, fez questão de pagar o nosso lanche e tentou manter uma conversa, coisa difícil já que ele quase não escutava.
Os galanteios do idoso foram engraçados, e não levamos todo aquele assanhamento a mal. É comum que as mudanças hormonais aos oitenta deixem a libido acesa, e ele não falou nada ofensivo. Pra mim estava tudo tranqüilo com o nosso novo amigo, até que ele sugeriu nos encontrarmos lá para outros filmes.
Minha colega gostou da idéia e pediu o telefone dele, e ele prontamente respondeu que como mora com a esposa e uma filha não poderíamos ligar pra lá, e que caso alguém perguntasse sobre nós ele diria que éramos suas professoras de inglês e francês, e que deveríamos dizer o mesmo.
E foi aí que eu azedei.
Acho que o flerte é saudável em todas as idades, mesmo para pessoas comprometidas, para que a auto-estima se mantenha em dia. Mas sou contra sacanear o outro. A história pronta do velho deixou muito clara a malandragem do cidadão, que pelo jeito já estudou muitas línguas estrangeiras ao longo dessa longa existência.
É triste ver um senhor que contou ter netos de mais de trinta anos ainda com tamanha disposição pra mentir pra esposa. Pra quê? Isto é mesmo necessário? A esposa acharia que ele está tendo um caso com uma mulher da idade dos seus netos se ela soubesse que ele nos pagou um lanche?
Homens precisam ser assim? A compulsão por mentiras pelo jeito não melhora com a idade, o cidadão continua mentindo “just in case”, pra evitar confusão, pra não magoar ninguém, porque a esposa não entenderia, e aí mente o tempo todo, sobre tudo, para a desgraçada.
Aí o cara ainda envolve quem não tem nada a ver no rolo. Tem uma montanha de assuntos mal resolvidos com a esposa e ao invés de resolvê-los vira pra mim e pede para que eu ajude a mentir pra ela! Mentir para a esposa dos outros é fogo né.
Eu não minto quase nunca, por princípio pessoal e por preguiça. Mentira sempre acaba gerando muito trabalho para ser sustentada. E não acho normal que mintam pra mim. Aí alguém que não me conhece, simplesmente me informa que então mentiremos juntos para a esposa dele. Oi?
Acho que o que me deixou mais chocada nisso tudo foi a mensagem de que não, as pessoas não mudam nem com oitenta anos. Porque obviamente ninguém aprende a ser malandro nessa idade. Quem é mentiroso aos trinta vai ser aos quarenta e etc, até um dia virar um velhinho mentiroso, e pronto. Um dia vai achar que está abafando com as menininhas no cinema mostrando como é safado e enrola a esposa e elas vão estar se divertindo com a senilidade dele. A verdade dói.
Aí a mulher que quer ter um relacionamento com um tipo destes, que a trata como se ela fosse retardada mental, precisa ficar ouvindo mentiras cretinas e tendo que fingir que acredita em professoras de inglês e afins, simplesmente porque o cara não tem coragem de falar na cara as coisas mais simples, ou ainda, não quer falar na cara para não abrir um precedente. Vai que a esposa resolve fazer amigos também! Aí não!
Ah, essas mentiras que os homens contam…